terça-feira, junho 12, 2007

Roubei um Manoel de Barros pra mim.

XXXII.

Há nos poetas uma aura de ralo?

XXXIII. (lembrança)

Um sujeito mancava de madeira.
Seu manco era oblíquo.
Sua boca atingia o canto.
Para avançar no poente, ele tinha que atravessar o rio.
O rio dobrava uma perna para ele passar; mas ele não dobrava a sua perna para passar o rio.
De forma que nós, do barranco, ficávamos, de um modo ascoso, esperando.
Era preciso amarrar uma corda na cintura do homem e depois puxar.
O homem atravessava o rio como um peixe fisgado pelo meio.
Poucos entendiam quase nada; mas eu entendia um pouco menos.
(É assim. Restolho, de primeiro, não passava de restos de uma erva seca; depois o restolho se tornaria a imagem de um pobre homem à beira de um ralo.)
Esse manco era um pobre homem à beira de um ralo.

(retirado de "CONCERTO A CÉU ABERTO para solos de ave", Manoel de Barros.)

3 comentários:

Juli =) disse...

Lembrei de vc hoje. O Welington deu como epígrafe de uma redação um Manoel de Barros (talvez uma parte/ um trecho de um). Era algo assim:
"Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras fatigadas de informar."
É do Apanhador de Desperdícios.

Beijoca.
Juli =)

Marcela disse...

Tenho outro dele aqui. Peça-me.

naná de castro disse...

Olha que eu fico com ele pra mim, Mar! hahaha..