quarta-feira, dezembro 10, 2008

Cegueira

Feche os olhos. Leia esse texto de olhos fechados ou, de preferência, não leia. Peça pra alguém ler pra você, se quiser escuta-lo. Você também pode tentar descobrir nele algum cheiro ou gosto, mas não pense a respeito de sua grande mensagem, ele não tem nenhuma grande mensagem que você já não saiba. Só estou colocando as coisas nos meus termos, caso queira saber.

O universo se manifesta de uma forma muito específica em cada um. Pode chamar de Deus se preferir, mas a questão é simples. Tão simples que não vou falar sobre ela, vou falar sobre como estou aprendendo a lidar com ela. Aprender significa descobrir que é possível.

As palavras no papel, ou na tela do computador, são imagens desenhadas. Nós podemos vê-las, não podemos toca-las, mas sabemos bem que elas estão aí. Fomos educados pra isso, descobrimos que é possível durante todo nosso passado. Também sabemos por experiência própria que o papel (ou a tela) também podem ser tocados. Diz-se que os índios daqui não viram as caravelas dos portugueses quando eles chegaram pela primeira vez na costa.

A vantagem dos cegos, dos cachorros e das plantas é que as pessoas conseguem olhar pra eles sem travas, porque sabem que eles não vão perceber. Pelo menos eu sentia assim, mas descobri que é um engano.

Concreto, palpável, sólido. Isso tem a ver com o tato.
É visível, aparenta. Aí é visão.
Também dá pra falar do cheiro, do sabor e do som, mas a realidade tem ainda outros sentidos que não precisamos catalogar, mas podemos aprender a perceber como parte da realidade. É só uma questão de conseguir alternar o foco pra essas sensações também.

Aprendi isso por causa de um garoto cego no metrô. Comecei a olhar e fui ficando cada vez mais curiosa com a beleza dele, ele tinha uma beleza muito específica, difícil de explicar, com lábios grossos e, apesar de eu não ter visto seus olhos, tenho certeza de que eram fundos. Comecei a perceber os detalhes e, quando vi, ele estava reagindo à minha energia, aos meus pensamentos. Não dissemos nada. Ele não me viu, mas tenho certeza de que ele me percebeu, e gostou de mim como eu gostei dele, logo de cara.

O necessário e suficiente, por que logo fomos embora, cada um pro seu caminho, e eu aprendi com ele que aceitar os limites é também ampliar o que houver neles de potencial. Assim se vive o que for necessário, de preferência chorando e sorrindo o suficiente.

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